domingo, 19 de outubro de 2008

Apenas pare.

Há algumas horas atrás eu tinha um objetivo bem definido. Esse objetivo consistia basicamente em escrever um post, ou melhor, um “manifesto”, a uma pessoa que gosto muito. Ainda vou fazer isso, não da forma como tinha decidido fazer, mas do jeito que agora acho melhor.
Mas, antes de qualquer coisa, eu, pessoa egoísta que sou, sinto uma vontade avassaladora de falar de mim mesma. É uma espécie de desabafo, que nunca fiz a pessoa alguma, nem a que me referi há apenas algumas linhas.
E isso também é pra você, minha cara. Principalmente pra você.

Eu tenho muitos defeitos. Sou egoísta, arrogante, pessimista, dramática, fria e, por muitas vezes, chata e irritante. Não são apenas esses, é claro. O que importa é que são muitos. O tempo fez com que alguns deles fossem melhorando, e, como nem tudo é perfeito, outros pioraram. Eu sou o que sou, não posso evitar isso, nem ir contra a minha natureza, mas é claro que gostaria de ser uma pessoa melhor.
E gostaria de ser feliz também.
Porque hoje mesmo percebi que não sou. Quem não me conhece bem poderia facilmente dizer: “Aquela garota deve ser feliz. Ela tem amigos, uma família completa, é inteligente, não é pobre, apesar de não ser rica, se diverte... Enfim, é uma garota feliz.”
Mas o pior é que quem me conhece “bem” também diria o mesmo.
Eu tenho amigos, sim. E me divirto muito com eles. Todos os dias temos motivos pra se acabar de rir de alguma besteira qualquer. Mas nenhum deles sabe como eu me sinto realmente.
Exceto você.
Só que hoje vi que nem você deve saber. Porque eu nunca contei.
Não os recrimino por não saber. Eu não quis que soubessem. Não era necessário, não ia fazer diferença. Ninguém além de mim mesma poderia entender se eu dissesse.
Eu sempre fui pessimista. Distorço as coisas ruins que me acontecem, tornando-as ainda piores. Na minha cabeça tudo sempre é pior do que realmente é, e faço o maior drama por causa disso. Então, como não consigo mudar essa minha terrível característica, criei outra para me proteger: o humor. O humor negro tão característico das pessoas feias, infelizes ou simplesmente pessimistas. Sei, por experiência própria, que é assim que essas pessoas se defendem do mundo e de si mesmas.
Funciona assim: faço piada da minha própria desgraça, e da desgraça alheia também. Assim amenizo a minha visão dramatizada das coisas, e de brinde ainda faço as pessoas rirem. Sim, tenho conseguido fazer isso. Gosto quando riem. Significa que funciona.
Seria muito bom se todas as pessoas tivessem senso de humor e aprendessem a rir da própria cara. Deixa a vida menos séria.
Por outro lado, esse humor estranho não serve apenas para bater de frente com o pessimismo. Serve também para me esconder de outro problema: a timidez.
Sei que algumas pessoas diriam que não sou tímida. Mas há um número muito maior de pessoas que têm absoluta certeza de que sou sim. E isso dificulta a vida de qualquer um. É estranho, mas o exagero, o humor, a tagarelice, são geralmente armas que as pessoas tímidas usam para não parecerem tímidas. Eu faço isso também, às vezes sem resultado.
Minha família não é nem um pouco perfeita. Todos têm problemas, todos brigam, ninguém se respeita. Acho que a família devia ser um refúgio. Deviam ser pessoas que sempre me aceitariam, seja lá de que jeito eu fosse. Mas não é assim. Estão sempre me recriminando, dizendo que eu deveria ser isso ou aquilo... Queria que fossem as pessoas com quem eu me sentisse feliz e à vontade. E segura. Mas não é assim. Estou sempre me policiando para não fazer algo que não vão gostar, para não ser desagradável. Para não ser eu mesma.
É por isso que gosto tanto de estar com meus amigos. Por isso que gosto tanto de morrer de rir de uma besteira qualquer, ou de simplesmente conversar com eles. E quando eles não estão por perto eu procuro ficar sozinha. Mesmo em casa, eu sempre procuro ficar sozinha. E mesmo chega alguém dizendo: “O que você tem?” Mas não é no tom preocupado e gentil. É mais no tom de “ela deve estar fazendo algo errado”.
Por isso não fico falando dos meus problemas a ninguém. Uma coisa ou outra, pequenas desilusões amorosas, uma nota ruim, isso eu falo. Mas o que realmente me aflige eu procuro esconder. Não quero ser para eles uma pessoa chata e deprimida. Quero ser a garota inteligente e engraçada. Apenas isso. Um pouco de normalidade às vezes vai bem.
Às vezes choro muito. Acontece com pouca freqüência, mas acontece. Eu vou guardando tudo, e então, de madrugada, choro. É como se eu programasse o melhor horário para fazer isso. Quando todos estão dormindo, eu choro silenciosamente, discretamente. E passo a madrugada toda chorando, até dormir de tanto chorar. E, pra aproveitar a oportunidade, vou logo remoendo tudo que me perturba ou perturbou, pra chorar logo tudo de uma vez e não precisar fazer de novo.
Eu sou uma pessoa estranha.
Eu finjo ser mais inteligente, mais experiente, e melhor do que realmente sou. Sou tão arrogante. Mesmo sem ter motivos, eu sou. Pra mim, o que eu faço tem de ser sempre o melhor. E está sempre certo. Acho que no fundo eu quero apenas agradar. O que eu faço tem de ser melhor, porque quero que as pessoas gostem de mim. Quero que me admirem, me respeitem. Não quero que me achem idiota.
E, no entanto, eu sempre acabo fazendo coisas idiotas. E sempre esqueço que não sou melhor que ninguém.

Pensando melhor, acho que você já sabe de tudo isso. Talvez eu já tenha te dito algo assim. Porque, afinal de contas, você é a única pessoa em quem eu sempre confiei.
Você sabe quais são meus defeitos e, evidentemente, não deve gostar muito deles. Assim como conheço os seus e não gosto nada deles. Mas, se os tirarmos, o que será de nós? A vida seria muito sem graça sem eles, não seria?
Afinal, somos tão diferentes. Em algumas coisas somos completamente opostas. Talvez seja por isso que nos gostamos tanto.
Confesso que, muitas vezes, cheguei a te odiar. Odiei coisas que você fez ou disse, e odiei também o fato de não conseguir ficar te odiando por mais de algumas horas, às vezes até minutos. Depois desse tempo eu não agüento mais e passo por cima do motivo que me fez pensar assim de você. Faço vista grossa, tento não me importar mais.
Você sabe como são nossas brigas sérias, não é?
Somos pessoas difíceis. Toda vez que brigávamos e ficávamos sem nos falar por algum motivo qualquer, cada qual pensava firmemente: “Ela é quem está errada.”
Você tinha tanta certeza de que estava certa quanto eu tinha de também estar, e por isso só voltávamos a nos falar quando uma de nós admitia que tinha errado, mesmo tendo total e absoluta certeza de não ter errado coisa alguma.
Essa pessoa geralmente era eu.
Agora isso está acontecendo de novo, antes mesmo da briga começar. Talvez nós nem vamos brigar dessa vez. Estou tentando evitar isso.
Eu tinha decidido, hoje de tarde, a não falar mais com você até que você parasse de se drogar. Eu estava realmente disposta a fazer isso, mas, como você vê, acabei de desistir. Não tenho forças suficientes para continuar com o meu objetivo.
Por falar em forças, você me disse uma grande besteira há uma semana. Você me disse que as pessoas se viciavam porque eram fracas, e que você não era fraca.
Pois sinto lhe informar que é sim. E muito.
Só o fato de ter começado a fazer isso já é uma prova conclusiva de que você é extremamente fraca.
Assim como eu sou, por nem sequer poder fazer você parar.
Não sou tão idiota a ponto de achar que você pararia de fazer qualquer coisa que achasse certo só porque eu deixaria de falar com você. Afinal, esse é um modo um tanto infantil de tratar as coisas. “Não vou mais falar com você, então pare.”. Não, não funciona.
Mesmo porque eu não acreditaria se você por acaso me dissesse que tinha parado. Sei disso porque me conheço e conheço você também.
Talvez você não saiba, mas velhas mágoas me fizeram desconfiar muito do que você diz, às vezes. Talvez até sejam mágoas infantis, digamos assim, mas são mágoas que ainda nãos e curaram.
Por isso às vezes penso que você inventou essa história de estar se drogando. E por isso também penso que, se você realmente estiver, vai ser muito difícil eu algum dia acreditar que você parou.
Você vai ficar ofendida com essas coisas que estou dizendo. Provavelmente também vai achar um grande desrespeito eu estar publicando algo tão íntimo. Ou talvez você nem se importe. Talvez você apenas ria e diga “Que bobagem! Eu estou certa. Não sou fraca como ela pensa que sou”.
E, com a mesma convicção, vou continuar sabendo que estou certa também. Dessa vez não é nada ambíguo o bastante para que nós duas tenhamos chance de estar certas.
Não estou tão próxima de você quanto gostaria de estar. Não posso ir até aí e te chacoalhar até que você pare de pensar e fazer besteiras. Não posso mudar sua mente, assim como você não pode mudar a minha.
Não podemos sair livremente para nos divertir juntas, como gostaríamos de fazer. Também ainda não podemos morar juntas. Podemos apenas nos falar e às vezes nos encontrar para conversar mais ainda.
Queria estar mais perto. Porque você é a pessoa de quem eu mais gosto no mundo, e você sabe disso.
E digo, sem presunção, que também sou extremamente importante pra você. Sei disso. Ou então você a pessoa mais cruel do mundo por me fazer acreditar nisso, mas não acredito nessa possibilidade. Acredito sinceramente que somos importantes uma para outra igualmente. Acredito sinceramente que nos amamos, no sentido mais completo que se possa imaginar.
Porque, ao menos pra mim, não é possível amar amante algum mais do que a um verdadeiro amigo ou amiga. A amizade é um amor completo.
Você é tudo pra mim. Posso passar o resto da minha vida encalhada e infeliz, se você estiver ao meu lado.
E sou egoísta. Tenho ciúmes, quero você só pra mim. Não quero que ame ninguém mais do que a mim. Não consigo suportar a idéia de que um dia você possa me trocar por outra pessoa.
Quando você diz que conheceu alguém, que está gostando de alguém, que está apaixonada ou algo assim, eu sempre acho defeitos nesse alguém. Você já deve ter percebido isso. Deve achar que é o meu jeito, que faço por brincadeira ou que sou apenas implicante mesmo.
Mas não. Eu quero você só pra mim. Tenho medo que esse alguém te leve pra longe de mim.
Sou louca, não sou? Eu sei que sim. Você me chamará de psicopata, maníaca, ciumenta e tantos outros adjetivos que, brincando, você sempre usou para mim. E acredito que todos eles sejam adequados.
Acredito também que você não vai deixar de gostar de mim por causa disso. Eu espero sinceramente que não deixe, pois, como eu já disse, não posso suportar a idéia de perdê-la.
E é justamente por isso que quero que pare de se drogar, antes que seja difícil demais. Sinto-me terrivelmente impotente quanto a isso. Não posso fazer nada.
Posso apenas lhe pedir que pare. Por mim, por você ou por qualquer outro motivo que você queira. Por nós.
Você sabe que estou terrivelmente deprimida. Sabe que não suporto mais muitas coisas. Por favor, não piore isso. Apenas fique ao meu lado até a dor passar.
Uma vez, ou melhor, muitas vezes, eu disse que toda dor passa. E acredito realmente que isso seja verdade. O problema é que às vezes demora tanto...
Fique aqui comigo, segurando minha mão até que isso passe.
E pare, por favor. Estou pedindo.
Apenas pare e fique aqui.

4 comentários:

Mah disse...

Sinceramente, não sei o que comentar, mas sinto que você precisa disso. Saiba que seu texto me tocou, não foi por dó nem por nada disso, pq nesse texto eu vi eu mesma, o quando sou compulsiva. Se você tiver se descrevido com sinceridade (o que não duvido mesmo) e se o que eu penso de mim for verdade somos muito parecidas, com algumas pequenas exceções, é claro. ^^
A gente sabe, que em certos momentos parece q ñ tem motivo nenhum pra continuar, só sabemos que devemos (ou melhor, nem isso). Continue, por favor. Um pedido de uma pessoa desconhecida.

Justine disse...

É de perder o fôlego, a tua reflexão! É um grito lancinante e pungente, que qualquer coração sensível tem de ouvir. Que consigas que ELE te ouça!
Abraço

' Rôh disse...

Pouxaa... Fiquei tocado. Faço das suas palavras as minha e sempre digo isso a ela.

Um cheiiro, amor da minha vida. ;D

La Vie disse...

Lindo texto! Sincera ...

Psicografia (Ana Cristina César)
"Também eu saio à revelia
e procuro uma síntese nas demoras
cato obsessões com fria têmpera e digo
do coração: não soube e digo
da palavra: não digo (não posso ainda acreditar
na vida) e demito o verso como quem acena
e vivo como quem despede a raiva de ter visto"